Imagine a situação: após o falecimento da mãe, a filha, única beneficiária do seguro de vida, tem o benefício negado em razão do atraso de duas prestações do contrato de seguro.
Foi o que aconteceu no caso apreciado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) quando julgou o AREsp 625.973. Embora a filha tivesse providenciado o pagamento das duas parcelas após o falecimento da mãe, a seguradora alegou que o atraso levou à extinção automática do contrato.
O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) determinou o pagamento da indenização porque a segurada não havia sido comunicada do atraso e nem dos efeitos contratuais da inadimplência. A decisão foi mantida no STJ. Segundo o relator, ministro Villas Bôas Cueva, o entendimento aplicado está em consonância com a jurisprudência do STJ.
“Com efeito, como consignado na decisão agravada, a Segunda Seção desta corte superior consagrou o entendimento de que o mero atraso no pagamento de prestação do prêmio do seguro não importa em desfazimento automático do contrato, pois exige-se, ao menos, a prévia constituição em mora do segurado pela seguradora, mediante notificação ou interpelação”, afirmou o relator.
Doença preexistente
No contrato de seguro de vida, também é preciso transparência nas informações prestadas. O seguro não será pago se o segurado, agindo de má-fé, silenciar a respeito de doença preexistente, ainda que a seguradora não exija exames médicos no momento da contratação.
Uma cobertura securitária foi negada em São Paulo porque o segurado já era portador da doença que o levou à morte. O caso chegou ao STJ, e a decisão, também da Terceira Turma, confirmou que a seguradora não tinha o dever de indenizar, mesmo sem ter exigido exames prévios para a admissão do contratante.
Para o STJ, “a seguradora só pode se eximir do dever de indenizar, alegando omissão de informações por parte do segurado, se dele não exigiu exames clínicos, caso fique comprovada sua má-fé”. No caso apreciado, como as instâncias ordinárias concluíram, com base nas provas dos autos, que o segurado efetivamente omitiu seu real estado de saúde, o beneficiário não teve direito à indenização.
Renovação
O tribunal também já teve a oportunidade de se manifestar em muitos casos que tratavam de aumento nas prestações do seguro. A Segunda Seção, apesar de reconhecer que a renovação da apólice muitas vezes é necessária para o reequilíbrio da carteira, concluiu que essa alteração deve ser feita de maneira suave e gradual, sob risco de a seguradora violar o princípio da boa-fé.
O entendimento pode ser conferido no acórdão do REsp 1.073.595. Um segurado alegou que, após mais de 30 anos de adesão a seguro de vida, foi surpreendido com a oferta de três alternativas de manutenção do contrato, todas excessivamente desvantajosas.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, entendeu que “a pretensão da seguradora de modificar abruptamente as condições do seguro, não renovando o ajuste anterior, ofende os princípios da boa-fé objetiva, da cooperação, da confiança e da lealdade que devem orientar a interpretação dos contratos que regulam relações de consumo”.
De acordo com a decisão, verificada a necessidade de correção da carteira de seguro em razão de novo cálculo atuarial, a seguradora deve estabelecer o aumento de forma suave e gradual, por meio de um cronograma extenso, do qual o segurado tem de ser comunicado previamente, para que possa se preparar para esses novos custos.
Revisão inviável
O STJ também já consolidou o entendimento de que o conceito de acidente pessoal delimitado em cláusula de contrato de seguro de vida não pode ser examinado em recurso especial.
No julgamento do AREsp 683.856,o segurado, que pleiteava indenização de seguro de vida alegando que a aposentadoria por invalidez foi decorrente de problemas psiquiátricos adquiridos com a atividade profissional, recorreu ao STJ após seu pedido ter sido negado em primeira e segunda instância. As decisões consideraram que o seguro de vida cobria apenas a hipótese de invalidez decorrente de acidente de trabalho, e não doença.
No STJ, o segurado alegou que o problema psiquiátrico era decorrente do excesso de ruído na área da usina em que trabalhava e que o fato deveria ser enquadrado no conceito de acidente de trabalho.
O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, entendeu que para decidir em sentido contrário ao afirmado pelo tribunal de origem seriam necessários a interpretação de cláusula contratual e o reexame de provas, situações vedadas pela Súmula 5 e pela Súmula 7 do STJ, respectivamente.
Suicídio
Em 2015, no julgamento do REsp 133.4005, o STJ reviu seu posicionamento a respeito do dever da seguradora de indenizar segurado que cometeu suicídio dentro do prazo de carência de dois anos da assinatura do contrato (artigo 798 do CC/02). Antes dessa decisão, o entendimento aplicado era de que a seguradora só não teria a obrigação de indenizar se comprovasse que o seguro foi contratado com premeditação pelo suicida.
O novo entendimento, firmado pela Segunda Seção, estabelece que o “artigo 798 adotou critério objetivo temporal para determinar a cobertura relativa ao suicídio do segurado, afastando o critério subjetivo da premeditação”.
No caso apreciado, a seguradora se recusou a pagar indenização equivalente a R$ 303 mil referente a seguro de vida contratado um mês antes do cometimento do suicídio. De acordo com o colegiado, a intenção do novo código é evitar a difícil prova da premeditação, sanidade mental e capacidade de autodeterminação no momento do ato.
A conclusão foi de que “durante os dois primeiros anos de vigência da apólice, há cobertura para outros tipos de óbito, mas não para o suicídio. Após esses dois anos, por outro lado, diante do suicídio, a seguradora terá de pagar o prêmio, mesmo diante da prova mais cabal de premeditação”. AREsp 625973 – REsp 1073595 – AREsp 683856 – REsp 1334005.
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